Na verdade,o que chamamos de cultivos de curto ciclo, são o resultados de uma seleção ’natural’ que ocorreu ao longo dos 12 anos de atividade agropecuária: esses produtos ‘funcionam’ no nosso microclima, são ou podem ser economicamente explorados com as terras que nós possuímos (se precisar de mais terras, ou áreas mais adequadas, é um instante para nós comprar de vizinhos e expandir dessa forma!), têm mercados atraentes, se encarados‘seriamente’ (volumes mínimos de plantio, investimentos adequadosna penetração dos mercados e na colocação das vendas, etc.), temos conhecimentos técnicos mais que adequados para agir com a necessária sabedoria e experiência, e… aí vai, só esperando o momento correto para nos (re) engajarmos nessas culturas.
Existemoutras lavouras interessantes que poderiam ser consideradas, mas culturas novas vãonecessariamente precisar de experimentação, observação por, pelo menos, um ou dois anos, estudos desuas viabilidades, etc., antes de estar com um grau razoavelmente sólido do real potencial e da real viabilidade agronômica e mercadológicadesses novos produtos.
Por exemplo, já sabemos o que NÃO dará certo cultivar nessa região: banana, abacaxi, tapioca, cravo, não, não, não, não…. e aí numerosas outras culturas que experimentamos e concluímos que não são atraentes. E por inúmeras razões também: clima, economia, produção, beneficiamento, mercado… etc.,basta abrir uma discussão sobre esses tópicos e podemos passar horas discutindo.
Portanto, os nossos campõessabemos que podem dar frutos (e ainda nessa lista, há prioridades…):
Chamamos esses de ‘os nossos negócios secundários’. Esses são as culturas de:
E desses, os de ciclo curto:
Não tente em achar uma lógicarobusta nessa definição de ciclo curto ou médio. É uma composição de fatores eminentemente técnicos, mas também psicológicos e intuitivos: podemos dizer que tal divisão nasce da sensibilidade que madurou nos líderes ao longo dos anos, mas engloba também fatores sociais e históricos do lugar. Às vezes, os dois ciclos deveriam estar juntos e receber uma análise mais crítica…, mas assim funciona para nós e assim… é! (maspode mudar…)
O mamão
Consideramos o mamão como o primeiro produto de uma lavoura consorciada com o limão.
A maturação de uma muda de limão é de entre três a quatro anos para que a planta produza economicamente. Com a vasta experiência do Dr. Wilson, tornou-se automático considerar essa lavoura como uma maneira de trazer receitas rapidamente pelo período de dois,no máximotrês, anos da vida da planta de mamão.
Assim, desde 2010fizemos as nossas mudas, e quase 53hectares de mamão foram plantados
com bons resultados no primeiro ano, reduzindo paulatinamente a produção até o terceiro ano.
Em setembro de 2010 plantamos aproximadamente 55 hectares em consórcio com o limão.
Fizemos inclusive um pequeno sistema provisório de irrigação de emergência,para suprir as necessidades da água do mamão, bem maiores do que as do limão. E não substituímos as plantas de mamão que morriam, deixando-as no chão como adubo: não pudemos continuar com as plantas de limão em produção!
Foi uma boa experiência, que aliviou bastante nosso fluxo de caixa e deu grande satisfação ver essas plantas maravilhosas produzirem frutos tão gostoso: por muito tempo a nossa cozinheira, Dona. Lene, inventou inúmeras maneiras de preparar mamão! (sugestão: experimente mamão com sorvete de creme e um licor como Drambuie ou um Lemoncello suave: elemento indispensável depois de uma feijoada!)
Em teoria, poderíamos continuarreplantando entre as ruas do limão (e consideramos essa prática com cuidado, pois os retornos do mamão se mostraram muito atraentes!), mas ficou evidente que as práticas de pulverização, necessárias para produzir um mamão comercializável de boa qualidade, não eram maisadequadasàs plantas de limão adultas.
Principalmente porque,com a entrada em produção dasplantas delimão, se tornou impossívelpulverizaro mamãocom adubos folhares e defensivos, e ao mesmo tempo colher a fruta. As regras de MRL (Maximum Residuous Level = níveis máximos de resíduos) na Europa são muito estritas e qualquer excesso de produtos não permitidos poderia ter causado a anulação da nossa certificação com o GlobalGAP e bloqueado o nosso negócio de exportação.
Também, é necessário dizer, o mamão precisa de muita mão-de-obra e, apesar de ser consorciado com o limão, começou a desfocar as atenções da nossa lavoura principal. Essa experiência se tornou importante os anos seguintes, quando decidimos conjugar o limão com o maracujá.
The passion fruit, the maracujá
Em 2010, com a experiência acumulada com o mamão, decidimos de plantar maracujá em consórcio com a nova plantação de limão na Peralba Rio e Peralba Nova Rio.
Foi um sucesso.
As pulverizações e adubações coincidiram em composição, pois são favoráveis para ambas as culturas.
Além disso, o maracujá deixou sombra para as plantinhas de limão
Commão-de-obra farta e os trabalhos gostosos… com as nossas técnicasde poda…
… e de inseminação humana…
e se demonstrou um produto de fácil venda, diretamente nos supermercados das cidades locais (Nazaré, Valença e Santo Antônio), que nos permitiu manter custos de transportes baixos e entregas fáceis.
O nosso parceiro na Holanda também ficou muito interessado em iniciar um plantio em escala comercial dessa fruta. Imediatamente plantamos cinco hectares para experimentar.
Os holandeses trouxeram sementes especialmente selecionadas (e aprovadas pelas autoridades brasileiras), e tudo parecia como o início de uma nova lavoura de curto prazo, exceto que… a qualidade oferecida na UE é de uma fruta avermelhada e pequena que não tem mercado na Bahia. Com um aproveitamento de 30% a 40% para satisfazer um nível de qualidade para exportação e sem poder escoar
E tivemos que aprender rápido as regras dessas vendas: começamos a receber ofertas de todos os tipos por intermediários que queriam comprar toda a produção a preço fixo, por kg, por caminhão, por bestuntão, em troca de carros, com venda a prazo, venda à vista, cheque… só pra mencionar algumas modalidades.
E mais se comia, mais melancias chegavam!!
E a medida que as coisas se tranquilizavam, bem no meio das colheitas de melancias, fomos visitados pelos nossos parceiros holandeses. Quando viram tanta abundância e excitação, eles também se empolgaram, e dois meses depois contrataram uma empresa especializada em sementes que fornecia para eles na ??frica do Sul, sementes para melões. E assim, em 2011 entrarmos no sonho de alocar entre 50 a 100 hectares para essa cultura.
Primeiro precisamos avaliar se tudo era favorável, desde o tipo de terreno, qualidade da água, etc. Depois desses exames, concordamos em alocar cinco hectares para experimento com quatro tipos.
E os resultados, outras vez, foram muito bons: ótima fruta, cor perfeita, peso correto, casca dura, sem defeitos, só limpar, embalar e pronto… o novo negócio seria iniciado em 50 hectares… a não ser por dois detalhes: estação de produção curta e ausência de mercado local.
o restante da produção no mercado local, o custo final se demonstrou inviável. Nada viabilizou a possibilidade de vender em outros estados, pois nenhum atacadista estava interessado. Até pensamos em introduzir essa variedade como novidade em Salvador… e finalmente tivemos que abandonar a ideia.
Mas a plantação foi um sucesso!
E como em 2013 a estiagem continuou, porém não tão forte como no ano anterior, graças ao microclima da nossa área, tivemos chuvas suficientes e pudemos suprir quase 482 toneladas dessa fruta, a preços atraentes.
Mas foi uma experiência belíssima! O tipo de cultura, as flores maravilhosas, a exuberância da planta, a concomitância com o limão, e o sabor calmante da fruta, nos proporcionaram momentos maravilhosos.
As melancias cresceram enormes, deliciosas, 80 toneladas por hectare. Foi uma corrida para achar clientes, carregar os monstros de melancias e entregá-las nos supermercados!
E tivemos as surpresas costumeiras: cheques sem fundos, caminhões que desapareceram com a mercadoria (mas tinham pago antes), medida de peso a olho… e por aí vai, mas com 80 toneladas de fruta pronta para ser entregue a cada dois dias, não havia tempo para sutilezas. Foi uma corrida e um vai-e-vem desesperado pelas 8 semanas da colheita.
Mas foi divertido! E trouxe algumaspreocupações para pagar a folha do mês!
Dá vontade de comer agoraaa!!! Os quatro tipos de melão
Na região da fazenda temos entre 1.600 e 2.400 mm de chuvas esparsas ao longo do ano. Entretanto,no inverno, entre abril e agosto, não tem luz pois chove muito e o sol fica encoberto. Nesses meses a maturação é muito lenta. Mas o que matou o show foi a falta de um mercado local para esse tipo de fruta: todos os supermercadosrecusaram a se engajar na venda de uma fruta nova e sem demanda. Como a rejeição, mesmo obtendo uma qualidade de exportação que daria, historicamente, entre 50% e 70%, sem um mercado local atuante, os custos dessa operação seriam exorbitantes.
Os melões e as melancias 2010 foi o ano das experimentações e das iniciativas. O limão atingindo novas dimensões de cultivo, o mamão e o maracujá em consórcio acompanhando a expansão do limão, e agora a melancia entrando no território da Peralba.
De fato,houve duas ‘ondas’: a melancia para o mercado local (projeto que durou até a seca de 2012) e os melões para exportação.
O nosso líder do campo, o Dr. Wilson, capitaneou todo esse esforço. E nem por menos, pois a melancia e depois os melões foram plantados entre as linhas das mudas de limão e,em uns 20 hectares,maracujá, limão e melancias conviveram juntos, o primeiro pelos oito meses até a colheita das melancias, e o segundo por dois anos e meio.
E naquele período, comemos melancias no café-da-manhã, ao meio dia e no lanche!
E isso durou por dois anos… com a seca de 2012, não plantamos mais melancias! Triste. Também o limão estava crescendo e as pulverizações não combinavam entre as duas culturas (e, em algumas partes da plantação, com as três).
Mas Alba gostou!!
E como aconteceu com o maracujá, tivemos que parar aqui. Triste, mas fez sentido na época.
E teria tudo para dar certo.
A qualidade foi avaliada como excelente; o período do plantio até maturidade e colheita foi de meses, bem abaixo da norma; o uso de defensivos e adubos foliares foi dentro dos padrões de MRL da GlobalGAP; sendo consorciado, o que as mudas de limão receberam, os melões receberam também; não houve custos adicionais, pois o adubo que os melões receberam era o excedente aplicado aos limões, que teria sido perdido e teria adubado as gramas entre linhas. Mas seria impossível garantir a continuidade de entrega ao longo do ano, o nosso clima não permitiria. Mas, novamente, o que matou o projeto foi a falta de um mercado local… Quem sabe se, no futuro, produtos desse tipo irão ser introduzidos para venda?… Recentemente, encontramos esses tipos de melão em supermercados que servem clientes sofisticados… quem sabe se não daria para retomar essa cultura?…
A piaçava
A piaçava é extraída de uma palmeira cujas fibras (que se localizam na base das folhas) são utilizadas na fabricação de vassouras e coberturas. Essa planta é nativa da Bahia e o nome científico é: Attalea funifera.
A piaçava tem uma longa história na fazenda. Desde os primeiros meses que chegamos à Peralba, nos defrontamos com uma cultura sustentável, extrativista e centenária: a colheita da piaçava das plantas nativas da floresta e seu beneficiamento comunal.
A ideia de ter cortadores desse tipo de palma soltos nas nossas matas nos arrepiou. Apesar de ser uma cultura sustentável, ao longo de seis meses a cada ciclo de 18 meses, as plantas são colhidas e transportadas pelos cortadores até a estrada que corta a fazenda. Além de numerosas trilhas, nos deixou desconfortáveis ter 10 a 20 homens andando soltos pela floresta sem controle ou supervisão.
Demoramos muito antes de chegar a um acordo com um líder da comunidade local de Camassandi, o Josias. Também tivemos de entender que dificilmente teríamos sido capazes de interromper uma atividade tão antiga e enraizada no folclore local. O nosso chefe de segurança nos ajudou a chegar a um modus vivendi que satisfizesse a todo mundo: o Josias poderia continuar cortando a piaçava, mas teria que pagar 30% da produção para a fazenda e se comprometer a não perturbar a floresta com nenhuma outra atividade (como cortar árvores ou caçar ou pescar … ou qualquer outra malversação). Em troca, Josias poderia explorar a piaçava da fazenda sem cortar exageradamente as folhas, colher somente em tempos úteis, quando as plantas estivessem prontas, mantendo as plantas sadias e vitais. Além disso, ele e a turma de mulheres e meninos, poderiam usar o antigo galpão junto à casa do coronel para beneficiar as fibras e vendê-las a compradores tradicionais. Palavra de homem e aperto de mão.
E assim tem sido nos últimos anos. Em 2014 produzimos 62 toneladas de piaçava. Josias ficou feliz… e rico. Nós iremos usar as entradas para reformular o teto do galpão… às vezes com piaçava mesmo!!
Tudo indica que vai continuar assim por muito tempo.
As flores ornamentais
Na verdade, não podemos dizer que entramos no cultivo de flores ornamentais, mas tivemos essa experiência que vale a pena relatar, pois quem sabe no futuro,essa não seria uma atividade interessante?
Em 2013, um certo Dr. James Gardner, visitou a fazenda e naturalmente se enfiou nos cerrados da mata, aquela que às 14 horas já é escura, pois o sol não penetra a copa das árvores mais altas. E apareceu um dia todo excitado, dizendo que achou uma flor que ninguém conhecia. Essa mesma aqui na foto em baixo.
Quando dissemos a ele que essa era para nós uma erva daninha, que o pessoal tem que cortar àmão pois nasce em baixo das árvores de limão e cresce a uma velocidade espantosa, com o risco de matar a planta… ficou ainda mais excitado.
“Que tal cultivar essa flor e exportá-la para os Estados Unidos???? Expliquei a ele que não somos cultivadores de flores, que esse é um negócio de grandes volumes, etc., mas não deu em nada: o benemérito doutor se ofereceu para cultivar um hectare dessas flores (que a esse ponto se tornaram únicas, extraordinárias e desconhecidas, de acordo com ele) e ele mesmo se encarregaria em cortá-las, embalá-las e vendê-las.Bastava lhe dar um hectare embaixo das árvores e o resto ele assumiria, inclusive os custos.
Como temos alguns hectares de mata atlântica de reserva, foi fácil conceder, e ele escolheu um lugar bem longe das plantações e de fácil acesso. Com tudo isso, não caberia cortar nenhuma árvore, somente limpar um trato de terra de mato, foi tranquilo.
E ele plantou.
Seis meses depois carregou um caminhão de caixas que ele mesmo trouxe, com papel especial, permissão de exportação, tudo, e carregou 2.348 caixinhas de flores em quatro containers via aérea. E limpou e esterilizou tudo.
Passei recentemente no lugar e não restou quase nada, exceto essas duas flores que testemunham essa empreitada. Se alguém conhecer essa flor, é bem-vindo em nos explicar o que tem de tão especial e nos dar o nomecientífico, para que possamos procurar informações sobre essa espécie, algo mais do que uma mera lembrança de uma flor bonita… ou de uma oportunidade perdida…